sexta-feira, 1 de abril de 2011

GILLES VILLENEUVE – A ARTE DE PILOTAR ACIMA DO LIMITE (O CARA)


Gilles “domesticando” uma Ferrari 126C recalcitrante, em Buenos Aires.
Nas ultimas semanas vi muita gente comentando sobre as mentiras, que citadas à exaustão, transmutam-se em verdades eternas. Maluf e Goebbels foram os “autores” mais lembrados, embora existam diversos “atores” que utilizam-se desta técnica, no cenário político nacional e mundial. Eu mesmo, a 3 semanas atrás, estive relembrando a “lenda” de que o titulo do Rindt foi obtido ‘post mortem’ graças a uma “providencial” vitoria do Emerson. E agora, adiciono outra dessas lendas, a de que o Grande Premio de Mônaco de 1983 teria sido vencido pelo Senna, se não houvesse sido (aliás, corretamente) interrompido pelo Ickx após a chegada de um dilúvio. Sabe-se hoje que o Stefan Bellof estava muito mais rápido que Prost e Senna, e os alcançaria em 1 ou 2 voltas. Naquelas condições impróprias para corridas de carro, ninguém pode afirmar com segurança quem teria vencido, mas que o Bellof era o mais rápido sob a chuva, não há como negar. E no entanto, esta prova só é lembrada como a corrida que foi “roubada” do Senna. Lenda.
Gilles Villeneuve foi um dos pilotos mais espetaculares que a F1 já conheceu, e até hoje, 17 anos após sua trágica morte nos treinos para o Grande Premio da Bélgica de 1982, é mundialmente reverenciado. Em alguns países, especialmente na Itália, é idolatrado: a cada ano, por ocasião da corrida de Monza, é comum encontrarmos seu nome pintado no asfalto e vermos surgir no meio da torcida faixas com dizeres do tipo “Gilles, sei il piu grandi”, ou “Gilles, sei vivo”.
Mas, a cada ano em que a TV repete as suas proezas mais espetaculares, destaca-se apenas o piloto louco e destemido, fixando cada vez mais a imagem de um “showman” irresponsável, e não do incrível piloto que tinha o dom de levar um carro de corridas aos seus limites mais extremos. Fecha-se o ciclo, aperta-se o cerco, e a lenda Gilles vai sendo descontruida, direcionada cada vez mais para a linha da mentira consagrada, com a qual eu abri esses comentários.
Fosse eu aqui emitir apenas a minha opinião pessoal sobre Gilles Villeneuve, poderia incorrer no erro de, traído pela idolatria, exagerar nas tintas, e me sujeitar as criticas mais pesadas daqueles que guardaram somente as imagens fortes dos seus piores acidentes. Resolvi então me “assessorar” da opinião abalizada daqueles que o conheceram de perto, conviveram com ele nas pistas, e que sucumbiram diante de sua maior capacidade de duelar de igual pra igual com as leis da física !
Derrapando nas 4 com carro asa: só Gilles era capaz de andar assim e ser rápido.
Através de alguns destes depoimentos, é possível descobrir que, além de ser um piloto dotado de um talento natural e de uma coragem inigualável, era também uma pessoa boa, integra, honesta, de princípios, incapaz de recorrer a ardis e a conluios, a atitudes antiéticas, para atingir seu objetivo. E seu objetivo era um só: vencer, em qualquer situação. Nem que fosse vencer a batalha pelo décimo lugar, com o carro que ia imediatamente a sua frente.
Para ter certeza disso, basta ver o vídeo do Grande Premio da Espanha de 1981, quando ele correu a prova inteira com 4 ou mais carros tentando ultrapassá-lo, e manteve a liderança até a bandeirada. Sem nunca fechar a porta, mas sempre freando pra lá do “Deus me livre”. Nunca faltou espaço para quem quisesse arriscar uma tentativa desuperá-lo. E foram muitas tentativas, sem sucesso.
A disputa durou a corrida toda, com seus perseguidores alternando-se na caçada a um Villeneuve, que segurou a ponta até a bandeirada final.
Um de seus perseguidores nesta prova, Jaques Lafitte, falou: “Eu sei que seres humanos não são capazes de promover milagres, que ninguém tem poderes mágicos. Mas Gilles faz a gente duvidar disto. Ele é muito rápido !” Não dá pra imaginar nenhum piloto, em qualquer época, falando assim sobre seus outros concorrentes diretos, a não ser que fosse sobre Gilles Villeneuve ou Jim Clark.
Grande Premio da Espanha 1981.
Depois da corrida, Gordon Murray, projetista da Brabham, acrescentou: “Aquela Ferrari era péssima, lenta, mas Gilles jamais cometeu um erro durante a prova.”
Harvey Postlethwaite, tempos depois, comentou as vitorias de Gilles em Mônaco e na Espanha, em 1981: “Aquele carro , a Ferrari 126C turbo original (nota: antes de ser modificada por Postlethwaite), tinha literalmente ¼ do ‘downforce’ das Williams ou das Brabhams. Tinha uma vantagem de potencia sobre os Cosworths, certamente, mas também tinha um enorme tempo de resposta do turbo (throttle lag). Em termos de habilidade pura eu penso que Gilles estava num plano superior, em relação aos outros pilotos. Para aquelas corridas, em circuitos travados, a Ferrari 126C estava fora de seu ambiente. Eu sei bem o quanto aquele carro era ruim”.
Keke Rosberg, que foi seu rival na Formula Atlantic na America, resumiu suas disputas com Villeneuve: “Para Gilles, corridas eram verdadeiramente um esporte, por isto ele nunca era desleal com os outros. Você não precisa ser o melhor piloto para ser assim, qualquer um pode agir desta forma. Gilles era o “FDP” mais duro contra quem eu competi, mas era absolutamente ético. Se você conseguisse batê-lo na entrada de uma curva, ele te dava espaço. Mas logo depois ele já vinha colado você, já na próxima curva ! É certo que ele assumia riscos inacreditáveis – mas apenas para ele mesmo – e é por isto que eu fico ‘puto da vida’ atualmente, quando comparam Senna com ele. Gilles era um gigante como piloto, sim, mas era também uma grande pessoa.”
F. Atlantic: Villeneuve a frente de Rosberg em Edmonton - 1977.
Villeneuve e Arnoux.
Todos conhecem o filmete das ultimas voltas do GP da França de 1979, em Dijon. Villeneuve parte em 3°, atrás das 2 Renault, mas pula na frente e lidera até mais da metade da prova, quando seus pneus já estão deteriorados. Jabouille passa a frente na corrida, que vai ser a 1° vitoria de um carro Frances e a 1° vitoria de um carro turbo na F1. E logo na França ! Só que esta corrida nunca será lembrada por isto !!!! Na ultimas 4 voltas Arnoux se aproxima de Gilles com a outra Renault, e o povo exulta com a possibilidade de uma dobradinha de pilotos e carros franceses. O resto da estória todo mundo sabe, foram as 4 voltas mais eletrizantes da F1 em todos os tempos. Jeremy Clarkson, o Mr.Top Gear, narrando a corrida para a TV elogia Gilles a sua maneira: "o melhor piloto que alguma vez sentou o rabo num cockpit de Formula 1". Típico do Jeremy...
Mas, o mais importante é o comentário de René Arnoux sobre a disputa: “O duelo com Gilles é algo que eu nunca vou esquecer, o meu maior ‘souvenir’ das corridas. Você só pode disputar assim com alguém em quem você confia de olhos fechados, e você não vai encontrar muitas pessoas como ele. Ele me bateu, sim, e na França, mas isto não me incomoda: eu sei que fui vencido pelo melhor piloto do mundo!”
No GP do Canadá de 1979, Jones marca a pole, com Villeneuve em segundo. Na corrida Villenueve sai na frente e mantém a liderança por mais da metade da corrida, quando Jones consegue ultrapassá-lo. Villenenuve ainda tenta retornar a liderança, até o final, mas sem sucesso. Alan Jones comentou : “Eu o ultrapassei, e quando eu estava na liderança, abri um pouco de vantagem. Mas tão logo eu diminui um minimamente o ritmo, lá estava aquela ‘caixa de bosta’ vermelha (red bloody shit-box, no original) nos meus espelhos ! Villeneuve é inacreditável assim, isto é, ele nunca desiste. Ele é o melhor piloto contra quem eu jamais competi, e eu apreciei as minhas disputas com ele, mais do que contra qualquer outro, porque, com ele eu sempre sei exatamente o que esperar. Ele nunca vem em cima de você, nunca aperta você contra o muro, ou usa de qualquer outro truque.” E o seu team manager, Frank Williams completou: “Eu estava orgulhoso de Jones neste dia, nós tínhamos o melhor carro, e o único piloto na pista que nós temíamos era aquele pequeno Franco-Canadense...” .
No mesmo ano, durante os treinos para o GP dos Estados Unidos, Jody Scheckter, já campeão do mundo, faz o 2° melhor tempo, sob chuva intensa. Ao parar nos boxes, descobre que foi batido por Villeneuve. Jody comenta: “Eu assustei a mim mesmo, da maneira como guiei na minha volta rápida. Achei que eu tinha feito a melhor volta. Depois então eu vi o tempo do Gilles - eu ainda não entendo direito como foi possível – e ele tinha sido 11 segundos mais rápido !!!! E aqui eu me permito acrescentar: onze segundos por volta sobre o segundo colocado do treino, numa pista de pouco mais de 5 km de extensão, é coisa para extra-terrestres ou para magos.
Gilles na chuva, no Canadá, em 1978.
Assim era Villeneuve, capaz de fazer coisas fora da nossa capacidade de compreensão. No meio da temporada de 1979 Jackie Stewart falou sobre ele: “Eu acho que ele é soberbo ! E acredito que ele vai ficar melhor e melhor. No momento ainda comete alguns erros, como perder a tangencia ou ir por cima das zebras na saída, mas estou sendo hiper-critico. Seu talento natural é fenomenal – existe uma real genialidade no seu controle sobre o carro.” Em outra ocasião, adicionou: “Seu controle do carro é extraordinário, mesmo se comparado aos muitos pilotos talentosos contra quem eu tive a oportunidade de correr, ao longo dos anos. Ele guia um carro de GP no mais absoluto limite de capacidade do mesmo.”
Niki Lauda, até então, sempre comedido em suas afirmações sobre outros pilotos,declara: "Gilles era o piloto de corridas mais perfeito, e com o maior talento dentre todos nós. Ele era o melhor e o mais rápido piloto do mundo”. E em outra ocasião:”Atras do volante de um carro de corrida ele era assustadoramente rápido, nunca desistia de tentar mais um pouco, e podia safar-se das mais precárias situações com uma habilidade brilhante. Era o demônio mais rápido que eu já conheci”
O brasileiro José Maria Ferreira, o Giu, comentando uma corrida para a TV Bandeirantes disse: ”Gilles não passa onde pode, ele passa onde dá. E onde não dá, ele gosta ainda mais.”
Vinelleneuve X Alan Jones.
No GP da Holanda de 1979 Gilles fez aquela que é considerada por muitos a mais linda ultrapassagem jamais feita na F1 (mais bonita ainda do que a de Piquet sobre Senna, na Hungria), mas que não foi gravada em vídeo com um ângulo favorável, que permita admira-la em todo o seu arrojo e precisão. Colocou a Ferrari por fora da Williams de Alan Jones, na curva Tarzan, ao final do retão, e saiu na frente, na pequena reta seguinte, numa manobra considerada incrível. Na foto acima pode-se ter uma idéia desta ultrapassagem e do local da pista onde aconteceu. Infelizmente, muitas voltas adiante o pneu da Ferrari começa a esvaziar, o que faz Gilles rodar na curva Panorama. Retorna a pista com o pneu furado e tenta chegar aos boxes, mas a Ferrari vai se desintegrado pelo caminho. Gilles foi muito criticado por isto, porém os 2 titãs do jornalismo automobilistico vieram em sua defesa: seu amigo Nigel Roebuck e o eterno Dennis Jenkinson. O Jenkinson falou sobre Gilles: “A sua atitude e seu julgamento em alta velocidade, os seus reflexos, a sua tenacidade e a alegre excitação do seu estilo de pilotagem faz com que todos tenhamos vontade de ir a um circuito apenas para vê-lo em ação.”
A fortíssima pancada em Imola, 1980, na curva que hoje leva o seu nome.
Ao mesmo tempo, seus fãs (eu entre eles) já começavam a acreditar que Gilles era indestrutível. Pancadas fortíssimas como a de Imola, em 1980 e do Japão em 1977, não lhe trouxeram nenhuma conseqüência física. E só ele podia fazer coisas como andar rápido no Canadá, debaixo de chuva, com um aerofólio quebrado e obstruindo-lhe a visão, durante muitas voltas. O aerofólio finalmente desprendeu-se e Gilles passou a ser mais rápido, mesmo sem o ‘downforce’ na frente do carro, agindo sobre as rodas direcionais. Era quase inacreditável que alguém pudesse ser veloz sob aquele aguaceiro, sem o aerofólio dianteiro, mas Gilles era. Para ele não havia desafio impossível.
Poderia continuar falando sobre muitas corridas fantásticas de Gilles Villeneuve, como nas vitorias de Long Beach em 1979, liderando do inicio ao fim, e de Mônaco em 1981, em que perseguiu e ultrapassou Alan Jones a 4 voltas do fim. Talvez ele tenha sido um dos últimos pilotos a vencer em Mônaco com uma ultrapassagem, questão de pesquisar. Mas vamos continuar com as opiniões sobre ele, emitidas por gente do mais alto respeito.
Harvey Postlethwaite (projetista da Ferrari 126C2): ”Ele nunca guiou nada a uma velocidade que fosse qualquer coisa menos do que “flat out” (pé no fundo), quer fosse na pista ou na estrada”. E adicionou: “Ele era totalmente descomplicado e apolítico, sem qualquer detalhe que possa ser considerado. Era totalmente e completamente honesto. Se ele estivesse testando um carro e o carro fosse ruim, ele viria a você e diria: ‘Olhe, está uma bosta. Mas não me entenda mal, eu não me importo, posso continuar guiando ele o dia inteiro e vou me divertir a cada minuto, mas, sou obrigado a te dizer que o carro está um lixo’. O “Old Man” (Ferrari) adorava ele por isto! “
Enzo Ferrari: “Ele nos deixou de uma forma incompreensível. Esta fatalidade privou o mundo de um grande campeão, alguém de quem eu gostava muito, muito mesmo. As pessoas diziam que um dia ele deixaria a Ferrari, mas eu nunca acreditei nisto, porque Gilles e eu adquirimos tal afeição, um pelo outro, que éramos quase como pai e filho. Meu passado é pleno de luto...pai, mãe, irmão, filho, esposa...minha vida é cheia de memórias tristes. Eu olho para trás e vejo os meus entes queridos...e entre aqueles que eu amei, eu vejo a face desse grande homem; Gilles Villeneuve”. Gente, isto vindo de alguém como o velho Commendatore, é muito mais do que um elogio, é uma condecoração !!!
Juan Manuel Fangio: ”Ele irá permanecer como membro da família dos verdadeiramente grandes pilotos da historia do automobilismo de competição. O Sr. Enzo Ferrari, que é uma autoridade nessa matéria, compara Villeneuve a Tazio Nuvolari. Nuvolari, nos dias da minha juventude, era um grande ídolo. Todos os pilotos queriam se igualar ao grande Nuvolari. Eles tentaram o maximo, mas tudo que conseguiram foi imitá-lo. Ser comparado a Nuvolari por Enzo Ferrari é receber a mais alta avaliação. Villeneuve não corria para terminar a corrida, ele não corria pelos pontos. Ele corria para vencer. Embora fosse pequeno em estatura, ele era um gigante!” Receber um elogio destes de ninguém menos que o grande Fangio, dá a verdadeira dimensão do pequeno canadense.
Jean Sage (Chefe de Equipe da Renault, falecido recentemente): “Gilles era extraordinário. Todos nós, de todas as Equipes gostaríamos de ter tido Gilles Villeneuve como piloto. Pela maestria que ele tinha, pela habilidade que ele demonstrava. Ele podia fazer absolutamente qualquer coisa que quisesse fazer com seu carro. A maioria o considerava o melhor competidor com os carros de F1 da nossa era.”
Antes da vinda de Gilles Villeneuve para a Europa, Chris Amon, um piloto altamente considerado por todos, inclusive por Jim Clark, e tido como o maior azarado de toda a historia da F1, e James Hunt, foram vê-lo correr na America e voltaram impressionadíssimos. Mais tarde Amon comentaria sobre ele: “Eu só conheci um piloto no mundo que tinha o controle do carro que Gilles tinha, um piloto que sempre sabia onde estava, não importa o que tivesse acontecido ou o que estivesse acontecendo. E esse piloto era Jim Clark”
Em 1982 a Ferrari tinha um bom carro, que foi progredindo de corrida em corrida. E Gilles era um serio canditdato ao titulo mundial, que finalmente foi vencido por seu antigo rival (e fregues de caderno), Keke Rosberg. Seu companheiro de equipe desde 1981 era o fortissimo Didier Pironi, que fora muito bem recebido na equipe por Villeneuve. Ficaram amigos e Gilles confiava muito em Pironi. Durante 1981 e toda a primeira parte da temporada de 1982, Pironi, apesar de muito rapido, foi largamente batido por Villeneuve. Quando chegou o GP de San Marino, em Imola, havia uma crise politica na F1 e as equipes inglesas não compareceram a prova. Os unicos adversários das Ferrari seriam as Renault. Gilles lutou bravamente com elas, até que ambas as Renault tiveram problemas, e a vitoria em frente de seu publico estava garantida. A Ferrari sinalizou para que seus pilotos diminuissem e mantivessem as posições, Gilles em 1° e Pironi em 2°. Gilles reduziu e Pironi o comboiava, até que, a poucas voltas do fim, Pironi o ultrapassou. Pensando que o companheiro estava simplesmente dando um show para torcida, Gilles o ultrapassou novamente, e voltou a reduzir a velocidade. Até que Pironi, desobedecendo a instrução da equipe, o ultrapassou mais uma vez, a poucas curvas da bandeirada, não dando mais chances ao canadense para retomar a liderança. Gilles se sentiu traido pelo amigo, e nem queria ir ao podio. Acabou indo. Mas, ele que jamais esperaria uma atitude deste tipo, vinda de alguém em quem confiava, nunca mais falou com o companheiro de equipe. Mas, foram apenas 2 semanas...
Gilles e a Ferrari 126C2 em Imola.
Na corrida seguinte, em Zolder, Pironi tinha um tempo nos treinos que era 1 decimo de segundo mellhor que o seu, e Gilles já tinha usado os 2 jogos que estavam a sua disposição. Querendo baixar o tempo do companheiro de qualquer forma, Gilles monta no carro os 4 melhores pneus usados, e sai para uma ultima tentativa. Vinha em uma volta muito rapida, quando encontra lento a sua frente o carro de Jochen Mass. Num momento de hesitação entre ambos, Mass desvia para o mesmo lado que Gilles escolheu para ultrapassagem, e o choque entre os carros faz a Ferrari decolar a cerca de 220 km/h, atingindo o solo com o bico, num impacto violento. Gilles foi cuspido de seu cockpit e arremessado ao ar, preso ao banco e já sem o capacete. Seu corpo atinge o alambrado de proteção do circuito, e cai no chão. O atendimento médico chega rapido, mas logo é constatada sua morte clinica.
Inacreditável...por questão de respeito ao meu grande idolo Gilles, não coloco aqui as fotos do estúpido acidente.
Sobre o fato, Eddie Cheever comentou: “Numa situação como esta eu sei que eu teria ficado apavorado. Mas estou certo de que, quando Gilles sentiu sua Ferrari decolar, seu ultimo pensamento foi de raiva, pura e simples, porque ele realizou que tinha desperdiçado uma volta perfeita”
Nigel Roebuck, cronista e reporter da Autosport e da Motor & Sport, uma das maiores autoridades em corridas de automovel no meio jornalistico e um dos melhores amigos e dos maiores fãs de Gilles, escreveu um sentido obituário para o canadense. Mas, uma de suas frases sobre Gilles foi quase profetica: “Muitos pilotos de corrida correm riscos (como os trapezistas, por exemplo), mas Gilles era o unico que não usava ‘rede de segurança’...”
O edição de 1982 do anuário Autocourse tornou-se historica e valiosa porque a sua habitual lista dos 10 melhores pilotos do ano ficou com o 1° lugar vago, em função da morte de Gilles.
Em seu funeral, Jody Schekter, seu companheiro de equipe e campeão mundial em 1979, fez um simples e sentido elogio: “Eu vou sentir falta de Gilles por 2 motivos. Primeiro porque ele era o mais rapido piloto da historia das competiçoes automobilisticas. Segundo, porque ele era o homem mais genuino que eu jamais conheci.”
Com sua morte, Didier Pironi passou a ser o primeiro piloto da Ferrari e o principal candidato ao titulo mundial de 82. Venceu a corrida da Holanda e obteve mais um 2° e um 3° lugares, passando a liderar o campeonato. Entretanto, nos treinos livres para o GP da Alemanha sofre um grave acidente que deixou sequelas em suas pernas e o incapacitou para o automobilismo. Pironi voltou a competir em 1986, em corridas de lanchas offshore. Em 1987 sofre um grave acidente com sua lancha, numa corrida na Inglaterra, e tem morte instantanea. Poucas semanas depois de sua morte, sua esposa deu a luz a filhos gemeos, que curiosamente receberam os nomes de Didier e ...Gilles !!!
Aqui vale a pena um parágrafo. Em 1981, as vesperas do GP da Italia, o fabricante de lanchas italiano Brunno Abatte promoveu uma corrida com lanchas de sua produção, entre alguns pilotos de F1. Pilotaram as lanchas Gilles, Pironi, Giacomelli, Patrese e Marc Surer. Giacomelli venceu a primeira bateria. Mas não foi surpresa pra ninguém que Villeneuve tenha vencido a segunda bateria e na geral, usando de algumas manobras, digamos, radicais, para ultrapassar Pironi e Patrese.
Os que tiveram a chance de viajar com Gilles em seu helicoptero Agusta comentavam que ele pilotova o aparelho com a mesma destreza (e a mesma ousadia) com que pilotava seus carros de corrida e de rua. Quando se aproximava de Maranello, costumava voar baixo, “pulando” cervas vivas e passando entre arvores em alta velcodiade. Nigel Roebuck conta que quando vinha de sua casa em Monaco para Maranello, “pilotando” sua Ferrari 308 “preparada” na fabrica, Gilles guiava como se estivesse num carro de corridas. Tentava, viajando de carro, igualar o tempo de viagem com o helicoptero...Jody Scheckter acrescenta que, quando Gilles se aproximava de Maranello guiando sua Ferrari, começava a guiar como um alucinado, aparentemente para se fazer notar, tornando a chegada da viagem muito “emocionante” !
Gilles e a 126C2, de Harvey Postlethwaite: o carro que era pra tê-lo feito campeão, mas...
Em 1982 o brasileiro Nelson Piquet, então Campeão do Mundo, assinava uma coluna que era publicada após cada GP, na renomada revista semanal iltaliana Autosprint. Os comentários de Piquet em sua coluna publicada apos a morte de Gilles reproduziam a conclusão do laudo necropsial do piloto canadense: “morte causada por ruptura da coluna cervical devida a tração”. E Nelson concluia então que Gilles havia morrido enforcado pelo cinto de segurança. De fato, afirmava que diversos pontos de fixação dos cintos no monocoque haviam se rompido com o choque, permitindo que o banco e o corpo do piloto fossem lançados para fora do carro, como um projetil. Entretanto, um dos pontos de fixação do cinto tinha ficado no lugar, retendo o pescoço de Gilles e provocando seu enforcamento. Dai o fato de o piloto ter sido encontrado sem o seu capacete. Nelson criticava a Ferrari pela fragilidade do monocoque, culpando-a pela morte do colega. Segundo Nelson, a Ferrari visava apenas fazer um carro o mais leve possivel, sem se preocupar com a preservação da integridade do habitáculo, em caso de choques.
Tal fato rendeu um enorme discussão entre a Ferrari e Nelson Piquet, com a devida interveniência incendiária da imprensa italiana. Quando aconteceu o acidente com Pironi, na Alemanha, a foto da capa da revista Autosprint destacava, por sobre o ombro e ao lado do rosto que estampava a expresssão de dor do piloto frances, sangrando pelo nariz e ouvido, o montante do cinto de segurança desprendido do monocoque !!! Piquet contra-atacou a Ferrari em sua coluna, mostrando claramente quem tinha razão. Porem, este fato rendeu ao brasileiro o eterno rótulo de “personna non grata” a equipe do Cavallino Rampante.
Afinal não importa por culpa de quem – se das regras idiotas dos treinos da F1,da Ferrari, do circuito, ou de simples fatalidade – o mundo perdeu em Zolder 1982 o maior talento já visto na condução de um carro de corridas. Mas, no meu coração e na minha memoria ainda resta uma certeza indiscutivel:
“GILLES, SEI VIVO!”
"I will drive flat out all the time. I love racing."

GILLES VILLENEUVE
 
 .......BIG BEAR.......





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